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sexta-feira, 25 de julho de 2008

Clima seco, poluição e a dúvida por hábito

Um dos meus maiores sonhos como professor é fazer com que os alunos adquiram o mais saudável dos hábitos humanos: a dúvida. Receber informações sem duvidar delas é abrir mão do que nos diferencia dos outros seres vivos: a capacidade de raciocinar, inferir, imaginar...

Nos últimos dias, a mídia tem abordado a questão do clima seco que lota os hospitais e incomoda um bocado de gente. Como bem observou o panóptico, absolutamente ninguém faz referência à relação entre clima seco e poluição, todos seguem (ainda sampleando o panóptico) a missa da toalha molhada.

Para uma abordagem mais profunda do tema e para estimular nossas dúvidas, reproduzo abaixo o referido post (original aqui).

"A missa da toalha molhada
Por panoptico.wordpress.com

Você vai dormir e parece que tem um gato peludo preso na garganta - e pior, querendo sair? Seu filho sofre com mais uma crise respiratória? O seu nariz sangrou esta tarde? Metade do pessoal do escritório não para de coçar os olhos?
É difícil ter a dimensão dos problemas numa cidade gigante e variada. Pois a imprensa está aí para isso, para dimensionar e noticiar em massa o que é de interesse público.
Os hospitais estão lotados de crianças que não conseguem respirar? A imprensa está sempre atenta e, claro, vai investigar, aprofundar, trazer o debate à tona.



É hora de discutir o clima insuportável? Claro. E o que vemos? A santa missa. Antigamente rezada anualmente, atualmente rezada trimestralmente, a pregação é fácil de decorar: “deixe uma bacia de água na sala, uma toalha úmida no quarto”.
É isso em todos, todos os meios de comunicação. Em todos os jornais, no maior do Brasil, no com mais classificados, no “mais antigo da cidade”, no “a serviço do Brasil”. Em todas as redes de televisão, na com maior audiência, na do bispo, na do baú.



Nas redações, o texto da toalha molhada deve ficar num arquivo chamado “modelo clima seco”, mas o G1 foi além e fez um especial, que como vemos acima, é uma jóia do jornalismo de e para a classe média motorizada: “No trânsito, não tem jeito. Se há poluição, é melhor fechar os vidros e ligar o ar-condicionado. A fumaça de carros e caminhões parados no trânsito causa mais irritações nas vias aéreas do que o ar-condicionado”
É o milagre da construção textual que isenta o leitor de culpa. Você está no trânsito poluindo e acabando com sua própria respiração, sente irritação, e qual é a recomendação do portal da Rede Globo: fechar os vidros e ligar o ar-condicionado. O ar público está ruim? Liga o ar-condicionado particular! É a privatização do oxigênio.

A Folha de S. Paulo também subiu um degrau na mesma escada. Dia desses, junto à tradicional reportagem “XY de umidade. Pendure toalha úmida” havia a foto de três surfistas à beira-mar e o texto recomendava a ida ao litoral, onde a umidade é maior. Beleza pura! Todo mundo para Santos (quer dizer, a Folha recomendava Guarujá)!
Será que a umidade depende exclusivamente das chuvas?
Será que foi sempre assim? Quando a cidade tinha ampla cobertura vegetal não chovia 30 dias as pessoas não conseguiam dormir? Quando o transporte motorizado individual não dominava todo o espaço público os narizes das crianças sangravam?
Será que o clima seco tem a ver com a poluição? Será que no interior de São Paulo e Centro-Oeste do país tem a ver com as queimadas das plantações do aclamado combustível “limpo”?
Nada disso é sequer mencionado. Afinal, para que serve um repórter? Para dizer que faz tantos dias que não chove? A cidade há semanas com um clima intolerável e quem trata do assunto na mídia? A garota do tempo!
As pediatrias com filas para inalação e a prefeitura faz o quê? Convoca os secretários para pensar num plano emergencial? Propõe restrições à emissão de poluentes? Não, ou omite-se - o site do Centro de gerenciamento de emergências de São Paulo, por exemplo, apenas informa a previsão do tempo. Ou faz coro com as recomendações médicas: pendurar toalha úmida na porta da sala.

terça-feira, 17 de junho de 2008

Biocombustíveis, fome e política internacional

Muito tem se discutido sobre a complexa relação entre o uso dos biocombustíveis, a preservação do meio ambiente e o recente aumento de preços dos alimentos. Esse foi inclusive o tema da II Conferência Domus Ambientiae.A despeito da qualidade das discussões, alguns apontamentos fazem-se necessários.

1. O álcool etanol polui muito menos do que a gasolina e do que o diesel. Mas polui e não é pouco. A solução para o aquecimento global pode passar pelo uso de biocombustíveis, mas seu uso não é solução para esse problema.

2. Sua grande vantagem é vir de fonte renovável, e portanto diminuir nossa dependência de combustíveis fósseis.

3. É lógico que se os biocombustíveis passarem a ser usados em altíssima escala, terras que hoje destinam-se a produzir alimentos, passarão a produzir matéria-prima para os combustíveis e o preço dos alimentos aumentará. É a famosa Lei da Oferta e da Procura.

4. No entanto a atual alta de preços dos alimentos tem outras causas. O subsídio dos países ricos à sua agricultura é uma delas, como disse o presidente Lula e a FAO confirmou. Outra é a gangorra de preços natural do capitalismo. Em artigo muito esclarecedor (aqui) Rubens Ricupero mostrou que a atual alta dos alimentos ainda não foi capaz de elevar os preços aos níveis em que eles estavam antes dos anos 80, quando viveram uma forte depreciação nos termos de troca.

5. A tentativa de associar a alta dos alimentos com o biodiesel é de fundo econômico e geopolítico. Esse artigo do Antônio Ermírio de Morais ajuda a entender o potencial que o Brasil tem de se tornar um mega produtor de energia se os biocombustíveis passarem a ser usados em larga escala. Além de nossas reservas de petróleo recém descobertas temos que o álcool etanol de cana é muito melhor que o de milho, produzido pelos EUA. Segundo a ANP, enquanto o balanço energético do álcool de milho é de 1,2 (ou seja, após o processo de produção do combustível tem-se 1,2 mais energia do que foi gasto para produzi-lo) o balanço energético do álcool de cana beira a razão de 8,0!! É muito mais. Mas é óbvio que usar o álcool de cana interessa a muito pouca gente e a confusão que se faz com os biocombustíveis, tratando como se fosse tudo a mesma coisa não é feita por ingênuos.